De Maria à Maria


Todos os dias Dona Maria agradecia por tudo que não tinha. Logo cedo, antes mesmo de abrir os olhos, agradecia pelos poucos momentos de sono e sossego que a noite havia lhe dado. Sem ajuda do sol, começava seu dia com cânticos que ouvira desde garota. Encontrava conforto e companhia nas notas tortas e temas divinos que arregalava pra espantar o medo que sentia da escuridão que aguardava a manhã.

Lembrava de seus filhos que há anos não apareciam, estendia as mãos ao céu imaginando que estavam bem - Notícia ruim chega de pressa! - e voltava a lavar aquela montanha de roupas sujas pra conseguir a comida de cada mês. Imaginava ser mulher de sorte, por ter apenas três peças de roupas para administrar em seu lar.

Já findava o dia. Ao chegar em casa Dona Maria tomava sua medalha de Nossa Senhora Aparecida, e agradecia mais uma vez pelas dores que seu corpo sentia, mas sua alma ignorava.

Texto publicado em 24 de Maio de 2004.

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